Evento da Comissão de Direito Securitário da OAB-SP mostrou os aspectos positivos da operação da Polícia Federal para o seguro D&O
A Operação Lava Jato da Polícia Federal, iniciada em 2014 e, atualmente, em sua 37ª fase, trouxe impactos ao seguro de Responsabilidade Civil dos Diretores e Executivos – D&O, na sigla em inglês de Directors and Officers Liability Insurance. A começar pela sinistralidade, que aumentou, em média, 50%, logo no primeiro ano da operação. Mas, depois de um período inicial de retração do mercado, quando as regras se tornaram mais rígidas e os prêmios mais elevados, o seguro D&O se tornou mais flexível e cresceu. O aprendizado obtido pelo mercado de seguros nesse período foi discutido no evento “As experiências da Operação Lava Jato no âmbito do seguro D&O”, promovido pela Comissão de Direito Securitário da OAB-SP, dia 29 de novembro, na sede da instituição.
A presidente da Comissão de Direito Securitário da OAB-SP, Debora Schalch, lembrou o período de turbulências no D&O provocado pela Lava Jato, quando, então, os prognósticos mais pessimistas indicavam o fim deste seguro. “O D&O é relevantíssimo e, em vez de acabar, como muitos previram, acredito que vá se aprimorar”, disse. Em constante evolução, o produto tem passado por mudanças. A mais recente foi a regulamentação por meio da Circular Susep nº 541, publicada em outubro. “A circular tem gerado muitas discussões porque alguns conceitos não estão muito claros. Devemos unir conhecimentos e esforços para construir um produto adequado”, disse.
Amadurecimento do mercado
Daquela fase inicial da Lava Jato, Thabata Najdek, subscritora de riscos de produtos de Linhas Financeiras, se recorda dos equívocos provocados pela falta de conhecimento do D&O. Segundo ela, a imprensa, principalmente, não entendia o porquê de os executivos investigados serem beneficiados pelo seguro. “O D&O não cobre corrupção” frisou, acrescentando que os executivos envolvidos terão direito à cobertura seguro para pagar os custos de defesa judicial até o trânsito em julgado da ação. “Aquele que admitir sua responsabilidade dolosa, por meio de delação premiada, ou for condenado pela Justiça, perderá a cobertura do seguro e terá de reembolsar a seguradora”, disse.
Embora o D&O tenha adquirido fama por causa da Lava Jato, a sinistralidade do produto não é afetada apenas pelos casos de corrupção. Segundo a especialista, a demanda do seguro também é alta para os sinistros envolvendo questões trabalhistas e penais, além de crimes tributários. Outro motivo de demanda é o Código de Defesa do Consumidor, quando a Justiça entende que houve má gestão. “Caso os recursos da empresa não sejam suficientes para indenizar os prejuízos, a Justiça poderá aplicar a desconsideração da personalidade jurídica e penhorar o patrimônio dos gestores”, explicou.
Mas, apesar da alta sinistralidade, a notoriedade trazida ao D&O pela Operação Lava Jato foi positiva. Na visão de Thabata, evidenciou a necessidade do seguro para proteger o patrimônio de diretores e administradores contra os riscos de seus atos na gestão de empresas. “Trouxe também amadurecimento ao mercado. Antes, o D&O cobria tudo ilimitadamente, mas quase não havia sinistro. Agora, o seguro tem coberturas flexíveis, como a trabalhista”, disse. Segundo ela, no momento, o produto ainda está adequando suas coberturas para empresas com maior exposição a riscos.
Mudanças no D&O
Em crescimento contínuo, o D&O fechou 2015 com R$ 350 milhões em prêmios e neste ano deverá crescer 10%. Além da Lava Jato, o momento econômico do país tem estimulado as contratações desse seguro. Segundo Flávio Sá, gerente de Linhas Financeiras, atualmente, existem cerca de 7 mil apólices de D&O, um volume ainda baixo considerando as 13 milhões de empresas em operação. Mas, ele acredita que existe grande potencial para massificar o D&O.
As implicações da Lava Jato também afetam o D&O, como é caso, por exemplo, das ações coletivas (class action), principalmente nos Estados Unidos. Atualmente, segundo Sá, nove empresas brasileiras enfrentam ações coletivas calculadas em US$ 1 bilhão. Por isso, depois da Lava Jato, muitos fatores passaram a ser considerados pelas seguradoras na subscrição do risco de D&O. Entre os principais estão a composição societária, o tipo de capital, investimentos, performance financeira e a governança corporativa.
As seguradoras também mudaram a estrutura operacional do seguro, adotando exclusões de cobertura para segurados que praticarem atos lesivos ou pagamentos de comissões. “Existe restrição para qualquer reclamação que alegue prática de ato ilícito”, disse. A forma de indenização também mudou; em vez de adiantamento, agora as seguradoras adotam o reembolso no final do processo.
Honorários
Uma das questões mais polêmicas no âmbito do D&O envolve os altos valores de honorários advocatícios. De acordo com Dinir Salvador Rios da Rocha, membro da Comissão de Direito Securitário da OAB-SP, até maio deste ano, a defesa de executivos envolvidos na Lava Jato já havia consumido R$ 56 milhões em honorários de advogados.
Mas, as indenizações de D&O para os custos de defesa não se restringem apenas à Lava Jato, envolvendo também os seus desdobramentos. Segundo Dinir Rocha, um processo administrativo no Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) pode gerar custos de honorários entre R$ 100 mil e R$ 350 mil; na Controladoria-Geral da União (CGU), entre R$ 300 mil e R$ 1,2 milhão; e no Tribunal de Contas da União (TCU), entre R$ 260 mil e R$ 560 mil. Outros desdobramentos são as class action, atingindo honorários estratosféricos da ordem de US$ 2,5 milhões.
Em relação à perda do direito de cobertura securitária no caso de delação premiada, Dinir Rocha explicou que vale o conceito da indivisibilidade. “Significa que apenas o diretor que fez o acordo de delação perde o direito ao seguro, os demais permanecem cobertos pelo D&O”, disse. Já no caso de leniência, que envolve o acordo de delação da empresa contratante da apólice, o seguro não cobrirá mais nenhum diretor, ainda que alguns tenham agido de boa-fé.
Fonte: Prisma Comunicação Integrada – Márcia Alves, em 09.12.2016.
Publicado no site da Editora Roncarati